Marcador: Segredos Contrabaixísticos de Duda Pum-Pum-Pum e outros textos


– Querido, letra “P” de papai, de papagaio, de pipa, de professor…
– Mãe, “p” de pato, de pé…
E a irmã dele, até então quieta e só prestando atenção, interrompe a mãe e cochicha ao seu ouvido:
– “P” de porra, né, mamãe?
(minha filha, aos 4 anos)
– Mamãe, o que acontece com o corpo quando a gente morre?
– O corpo fica na terra e a alma sai, querido…
– E pra onde ela vai?
– Vai conversar com Papai-do-Céu…
– E o que ela vai conversar com ele?
– Cada alma tem a sua conversa com ele, meu filho…
– É… regras de morrer são regras de morrer, né, mamãe?
(meu filho, aos 5 anos)
– Você fez cocô hoje?
– Não. É que meu cocô tá em falta…
(meu filho, aos 6 anos)
– Mamãe, cocozinho faz bem pra barriga porque ela vai “disminuindo”, né?
(minha filha, aos 5 anos)
– Mamãe, por que a sua barriga fez esse barulho?
– Ela está fazendo barulho porque o estômago está trabalhando. A comida vai ser dissolvida, virar vitamina e ir para o sangue. O que não servir vira cocô e xixi.
– Ela vai virar vômito?
– Assim, a comida não é aproveitada e não vira vitamina.
– Eu já comi biscoito com suquinho, e ele nem quis ir pro sangue e nem foi prum lado e nem pro outro. Aí, depois eu vomitei!…
(minha filha, aos 5 anos)
Durante o banho, a mãe chamou mais uma vez o suvaquinho dele de “asinha”…
– Levanta a asinha para a mamãe lavar!
– Não é asinha, mamãe! É braço, entendeu? Repete: braço, braço!
– Pode ser braço, axila, suvaquinho, mas para sua mãe, o seu braço vai ser sempre asinha.
– Mamãe, eu queria ter asas de pterodátilo, um rabo de tiranossauro rex e uma cabeça que não é de triceátopo, é de… pode escrever qualquer nome… tiranossauro rex! Só não pode escrever pterodátilo, porque ele tem uma cabeça muito feia!…
(meu filho, aos 6 anos)

Uma noite, quase na hora de dormir, meu filho me pede para eu fazer um bolo de chocolate para ele.
– Tá muito tarde, querido!
Aí ele ataca de louva-a-deus e com as mãos juntinhas, implora:
– Por favor, mamãe, faz um bolo de chocolate prá mim, faz! Por favor!

A receita de bolo que vou passar para vocês foi criada nesse momento.
Ela é toda feita num mesmo recipiente e não precisa bater nadica de nada.

Ingredientes para o bolo:

100 gramas de manteiga com sal;
5 ovos;
Uma pitada de sal;
2 colheres (sopa) de açúcar;
2 colheres (sopa) bem cheias de leite em pó;
Meia xícara (chá) de água;
1 xícara + 2 dedos de Nescau;
1 xícara + 2 dedos de farinha de trigo;
1 colher (sopa) de fermento em pó.

Modo de fazer:
Derreta a manteiga por alguns segundos no microondas. Junte os ovos inteiros e o sal e misture bem. Acrescente o açúcar e o leite em pó e mexa bem.
Coloque a água aos poucos, porque pode ser que você não a use toda.
Acrescente o Nescau todo e dê uma boa misturada.
Faça o mesmo com a farinha. Veja a consistência da massa e coloque o restante da água se precisar.
Por último, coloque o fermento em pó, misture bem, coloque num tabuleiro untado com manteiga e enfarinhado (ou antiaderente), e leve ao forno pré-aquecido moderado até que, ao espetar o meio do bolo com um palito ou garfo, ele saia seco (uns 20 minutos talvez).
Tire do forno, espete o bolo todo com um garfo e regue com uma calda feita com 1 xícara e meia de água fervente e 2 colheres (sopa) de açúcar.

Minha filha sempre me pede o que ela chama de “docinho”. Brigadeiro para uns; docinho para ela.
Para a cobertura de “docinho”:
Faça um brigadeiro com 2 latas de leite condensado, 2 colheres (sopa) de manteiga com sal e 2 pitadas de sal em fogo brando, mexendo sempre para não grudar no fundo da panela.
Quando o doce começar a encorpar e a desgrudar do fundo e dos lados da panela, jogue por cima do bolo. Espere esfriar um pouco e polvilhe chocolate granulado, se possível de boa qualidade, porque os que existem no mercado normalmente são uma bosta.
Se você preferir esse bolo também com recheio de brigadeiro, faça o brigadeiro com mais uma lata de leite condensado, uma colher (sopa) de manteiga e uma pitada de sal, corte o bolo ao meio e divida a calda para as duas metades.
Repeti esse bolo com recheio e cobertura diversas vezes (e em muitos aniversários) e ele sempre ganha elogios, porque não fica doce, mesmo com a overdose de brigadeiro, e fica muito leve, por usar pouca farinha e muitos ovos.
Costumo usar uma forma redonda de 30 cm de diâmetro, com 4 cm de altura. Esse bolo rende de 16 a 20 fatias, no máximo.

Engraçada essa vertigem de estar preso hoje ao que vai te prender amanhã,
porque isso te prendeu ontem sem você saber,
e vai te prender prá sempre enquanto você só pressente os porquês…

Engraçada essa viagem pelo túnel do pensamento que te arrepia o corpo sem outro corpo
e que muitas vezes te faz negar esse mesmo outro e te leva a dar corpo às reticências…

Engraçada essa sensação de protelar dizer para o outro as dissonâncias que ecoam dentro de ti e te atormentam
E deixar a consonância do amor te tocar e sufocar entre tantas pausas…
Para ouvir a música que tanto te incomoda e que só toca dentro de você…
E que aguarda inutilmente os teus próprios aplausos…

Engraçado lutar pela paz às custas de tantas guerras
E ficar sentido com coisas sem sentido

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Bosque é um lugar que deveria se chamar busque…

Úmido, verde escuro, com raios de luz insistentes, que procuram driblar as folhas distraídas, na verde-esperança de conseguir conversar com a terra… Cheiro de mata, de mato, de chão, de musgo, num arco-íris de aromas, que os bichos da cidade, donos de outros idiomas e linguagens, vertem para “ar puro”.
Caminho por esse bosque querendo muito estar com os pés descalços, mas o medo de insetos estranhos, e a lembrança sempre presente de quem já brincou de pique- esconde em cima de um formigueiro, me fazem achar o tênis um grande invento da “natureza”… Mas é só olhar prá cima e ver alguns pássaros, que logo esqueço dos meus pés. Eu me esqueço das coisas incômodas olhando para cima (como quando procuro pelas minhas “estrelas”) e me lembro das coisas incômodas olhando para dentro…
Vejo pequenos arbustos escondidos por entre as árvores que insistem em filtrar os raios de luz, e me dou conta de que há muito mais coisas escondidas naquele bosque…
Mais à frente e muito bem escondida, está uma pequena jabuticabeira. Penso que Eva mordeu a maçã por falta de opção. Com certeza ela não estava num bosque tropical, onde há diversas opções de frutas bem mais saborosas que a insossa maçã, e também ainda não haviam criado a culinária, prá transformar a insossinha numa torta ou num bolo de maçã. Isso talvez tivesse dado à humanidade que acredita nessa história, um toque mais quente… Até como “do amor” a maçã é uma decepção depois da primeira mordida e, cá prá nós, uma banana tornaria a historinha muito mais sugestiva e divertida…
Agora se a Eva topasse com uma torta de maçã, ela poderia convidar o Adão para comê-la com chantilly. Isso sim seria um pecado original, porque comer maçã por maçã, qualquer formiga já devia fazer antes da Eva, mas não entrou para a história porque era uma formiga… A única formiga que entrou prá história foi a da fábula, e assim mesmo porque estava acompanhada de uma cigarra que fazia barulho…
Mas voltando à jabuticabeira… caio de boca nas frutinhas sem esperar por nenhum Adão.
Quando já estou completamente empanturrada, me dou conta de que a hora passou e que… nossa, é mesmo!!
Aí você deve estar pensando: o que ela estava fazendo nesse bosque?
Eu respondo: eu tinha um encontro marcado com o lobo mau, mas perdi a hora e ainda errei de endereço: bosque não é floresta!
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Sempre tive medo do mar, mesmo o achando lindíssimo e morando numa cidade praiana…

Às vezes chego a pensar que, se tive outras vidas, acabei muitas delas no mar…
Respeito o mar o suficiente para observá-lo sempre de longe, nunca dentro dele, salvo em embarcações e, mesmo assim, sempre atenta à possibilidade de, num caso de acidente, ter que cair no mar e nadar rápido o suficiente para que ninguém num momento de desespero se grude a mim e acabe de vez com as chances de sobrevivência mútua. O mar sempre me passa melancolia por seu infinito…
Conheço gente que tem essa melancolia e essa espécie de angústia com o infinito do céu e o fim da humanidade, ou com a sensação de infinito dos trilhos de trem.
A sensação de “imagine um ponto no espaço” das aulas de matemática é potencializada em mim quando estou frente ao mar.
Adoro ver pinturas e fotos de mar, e até mesmo de um bom passeio à beira-mar, mas dentro dele não entro há mais de 30 anos. Mesmo em pinturas, sinto algo estranho. Lembro-me que estava num museu e ao ver pinturas entre 1750 e 1800 de ondas gigantes e maremotos, fiquei impressionada.
Ontem eu tava dando uma aula, e meu aluno estava fazendo um movimento exagerado com os dedos da mão esquerda. Ao invés de só abaixar e levantar os dedos, ele estava fazendo movimentos circulares, o que atrasava completamente a emissão das notas.
Na hora, fiz uma analogia com o mar: “você já reparou que quando alguém está se afogando, sempre levanta e abaixa a cabeça em movimentos circulares, ao invés de abaixar e levantar em linha “reta”, como fazemos nas aulas de natação, que nos proporciona ar mais imediato?” “Pois bem, você está se afogando no contrabaixo.”
Já andei de canoa em rio com jacaré e piranha, mas a sensação de desconforto acontece sempre em rios grandes e no mar.
O mar é um infinito que me incomoda e me dá medo…
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